Por Douglas Belchior, retirado do Blog do Negro Belchior
Nu, orelha cortada com faca, marcas de espancamento no corpo, amarrado pelo pescoço em um poste na Avenida Rui Barbosa, no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro. Assim foi encontrado um adolescente negro, “acusado” de praticar furtos na zona sul carioca.
A situação foi relatada por Yvonne Bezerra, ativista de direitos humanos no Rio, através das redes sociais e teria ocorrido na noite da útlima sexta-feira (31).
Depois de ter sido socorrido pelos bombeiros, que removeram a trava de bicicleta que o prendia, o adolescente contou ter sido abordado por três homens que se denominaram “Os Justiceiros” e usavam motos. Em nome da “justiça”, o trio espancou o jovem com uma facada na orelha. Depois, tiraram a sua roupa e o amarraram ao poste.
O Brasil mestiço e a carne mais barata do mercado
Poderia aqui discorrer sobre os vários significados da cena forte, inadmissível e ao mesmo tempo banal e naturalizada apresentada pela foto acima. Nossa realidade é tão perversa que não seria exagero dizer que esse adolescente “teve sorte”. Afinal, os grupos de extermínio aqui denominados “justiceiros” (quase sempre compostos por policiais e ex-policiais) não costumam ser tão bondosos. Seu modus operandi é outro: matar e, se possível, sumir com o corpo.
Não por acaso, é exatamente o perfil deste garoto, jovem e negro, o alvo prioritário da violência no país, em uma absurda proporção de 7 para cada 10 vítimas de assassinatos, conforme já relatei aqui diversas vezes.
Mas o sentimento de repulsa à naturalização racista da violência dirigida ao corpo negro foi mais bem relatado nos parágrafos que encontrei no Blog do Controversias:
“Dia 2 de fevereiro, dia de Iemanjá. Enquanto o samba acontecia na Pedra do Sal, a poucos quilômetros dali, no bairro do Flamengo, puseram um negro nu preso pelo pescoço num pelourinho improvisado. Ele estava assaltando pessoas (ou foi o que disse quem publicou a foto). Pra servir de exemplo aos pretos ladrões. Recentemente, um caso semelhante aconteceu na praia.
Esse jovem não estava na Pedra do Sal ouvindo a alta poesia da música negra, tomando cerveja e conversando com seus amigos sobre o trabalho do mestrado porque tenha um delírio malévolo de assaltar pessoas, fruto de uma natureza mais maligna ou menos humana que qualquer pessoa, mas porque não existe espaço objetivo para dignidade e felicidade de todos no projeto capitalista, racista e violento de país que dirige o Brasil. Sem entender isso, não se entende nada e, facilmente, até mesmo sem perceber, se cai no colo dos fascistas.
Não existe vacina política histórica, nada está garantido e nada está assegurado; a humanidade se reinventa todos os dias. Repúdio absoluto e urgência de responder isso à altura. Não pode deixar naturalizar de jeito nenhum. Peço a todos que façam chegar a todas as organizações políticas, mandatos, movimentos e entidades democráticas de que tenham conhecimento.”
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