[texto] Volta às aulas para quem? ou sobre a necessidade de recuperar a força do movimento estudantil

Nossa contribuição para esta nova etapa da greve. Fazemos um breve balanço sobre como foi a mobilização até agora e perspectivas de próximos passos.

Esperamos que este texto seja útil para avançarmos e recuperarmos a força do Movimento Estudantil.

Leia em PDF (imprimir frente e verso): livreto-volta-as-aulas-para-quem-agosto-2014

Recomendamos também a leitura de outro texto nosso: “Por que somos a favor de cotas e permanência como eixos prioritários para o Movimento Estudantil” > https://rizoma.milharal.org/2014/06/10/texto-por-que-somos-a-favor-de-cotas-e-permanencia-como-eixos-prioritarios-para-o-movimento-estudantil/

Boa leitura!

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Volta às aulas para quem? ou sobre a necessidade de recuperar a força do movimento estudantil

Dia 07 de agosto será a primeira assembleia geral de estudantes da USP no segundo semestre. Para chegar até este ponto váios caminhos foram percorridos pelas/os estudantes em luta e mobilizadas/os lado a lado com trabalhadoras/es e docentes da USP. Este é um novo momento e uma chance renovada para recuperarmos a força do Movimento Estudantil e voltar a caminhar rumo a uma greve forte e vitoriosa.

Estamos passando por uma greve como não se via há tempos: as três categorias – funcionárias/os, docentes e estudantes -, das três universidades paulistas – USP, Unesp e Unicamp em luta unificada. Esta mobilização teve como estopim o arrocho salarial imposto pelo CRUESP no início do ano, mas representa também o mau-estar generalizado que há anos estamos submetidas/os através das políticas repressivas e privatistas impostas pelo projeto de universidade desenhado pelo governo do Estado de SP. Deve-se lembrar que o congelamento de salários representa uma política de cortes que o reitor Marco Antônio Zago vem usando para lidar com a crise orçamentária deixada por seu predecessor. Desde o início do ano, estudantes vêm perdendo bolsas que são essenciais para sua permanência na universidade e a verba repassada para as unidades diminuiu em aproximadamente 30%. Funcionárias/os terceirizadas/os tiveram seus contratos cancelados levando à demissão e o Hospital da USP foi praticamente abandonado às traças. Recaiu sobre estudantes e trabalhadoras/es o ônus de arcar com o rombo orçamentário gerado por má administração dos de acima e claro desvio de dinheiro público.
Certos de que esta crise não foi gerada por nós e que não vamos pagar esta conta, estudantes, funcionárias/os e docentes decretaram greve em 27 de maio de 2014. Funcionários/as e docentes estabeleceram seus eixos de luta e o movimento estudantil também o fez. Em assembleia geral estudantil foram traçados quais os pontos que nos afetam diretamente e por quais eixos seguiríamos em luta, foi assim que definimos 5 eixos prioritários para a greve que estávamos encampando: Implementação imediata de cotas raciais e sociais; políticas efetivas de permanência estudantil, resolução imediata dos problemas da EACH, fim de todos os processos com a reintegração de estudantes e trabalhadores expulsos/demitidos e a defesa da universidade pública – contra o pagamento de mensalidades.
Seguimos organizando a mobilização através de atividades com os cursos e diversos atos de rua. Em meio à greve iniciou-se a Copa do Mundo que nos levou para as mobilizações contra as injustiças causadas pela recepção deste megaevento dos empresários. A luta na USP caminhava lado a lado com a luta de diversos setores da classe trabalhadora. A greve de metroviários, professores municipais e tantas outras que se espalharam pelo país apontaram para a falência deste projeto gerido para e pelos de acima. Este novo ápice de mobilizações recolocou em pauta a possibilidade da mudança na mão daquelas/es que são diretamente afetadas/os. A luta pelo transporte, pela educação e por tantos outros serviços deixou de ser vista como “presentes” dados pelo Estado e passou a ser percebida como conquista das pessoas mobilizadas e em luta.

Este cenário de intensas mobilizações, somado com o período oficial de férias na universidade fez com que a mobilização estudantil não seguisse o ritmo intenso e admirável das/os trabalhadoras/es em greve. Ao contrário da greve estudantil, a greve das/dos funcionárias/os se massificou e se fortaleceu a cada dia como demonstram seus piquetes e ações diretas, como trancaços, atos de rua e mais recentemente o acampamento em frente ao CEPE/USP garantindo a não instalação dos estandes para a Feira de Profissões da USP. Após os trabalhadores e trabalhadoras afirmarem firmemente que não submeteriam a continuação da greve para a realização da feira (evento fundamental para o marketing da Universidade), o Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu uma “liminar  de  reintegração de posse à Universidade” que foi efetivada neste domingo (3 de agosto). Mais uma vez a USP sofreu uma intervenção da polícia militar, acabando com os piquetes que são métodos historicamente utilizados pela classe  trabalhadora  para garantir  e intensificar sua luta.

A resposta ainda é uníssona: NÃO TEM ARREGO! Funcionárias/os sustentaram a greve durante todo o mês de julho e agora com o retorno massivo de estudantes ao campus contam com a força estudantil para avançarmos lado a lado na greve.

 

Para reorganizar o movimento estudantil, os centros acadêmicos possuem papel fundamental. Cabe às entidades de base retomarem suas assembleias, recuperarem seus comandos de greve específicos no curso para conseguirem organizar as/os estudantes e voltar a massificar o movimento. Os centros acadêmicos ao lado do Núcleo de Consciência Negra, à AmorCrusp e à EACH mobilizada possuem a força que levará nossos eixos para a mesa de negociação com o Zago e que deixará claro que ou ele atende às reivindicações grevistas, ou a USP enfrentará a greve mais forte de sua história!
Foi  fundamental a participação do Núcleo de Consciência Negra da USP e da  AMORCRUSP nos fóruns do movimento estudantil para a construção das pautas de acesso e permanência. Embora  marcado por divergências, o movimento garantiu que essas duas entidades tivessem delegados/das eleitos/as em suas assembleias para o comando de  greve e foram estas que trouxeram ao movimento a voz daqueles/as que a reitoria não quer ouvir e quer calar,  COTAS JÁ e DEVOLUÇÃO DOS BLOCOS K e L, foram os gritos que voltaram à pauta e não podem mais ser secundarizados em nossos fóruns e ações.
A luta por Cotas raciais é uma bandeira histórica do movimento negro. Não se iniciou nem acabará na USP, e é papel do movimento estudantil garantir a força desta pauta, sempre fortalecendo o núcleo de consciência negra, entidade que possui o protagonismo desta luta dentro da universidade, resistindo a 27 anos enquanto polo de luta do movimento negro.
Fruto da reivindicação de movimentos sociais que exigiam a construção de um campus de universidade pública na periferia de São Paulo, a EACH (USP/Leste) há tempos passa por uma crise devido à contaminação de seu terreno. Após quase 1 ano de descaso, recentemente saiu a notícia de que o campus havia sido desinterditado e que a CETESB havia tomado medidas (duvidosas) para sua  descontaminação. Se por um lado a volta ao campus da USP-Leste deve ser encarada como alívio frente às dificuldades que a fragmentação ocasionou, a luta não pode parar. Nem que o trabalho tenha que ser recomeçado do zero é fundamental que os/as estudantes continuem mobilizados pela descontaminação efetiva de seu campos e pela punição de todos os (ir)responsáveis. A forma como a reitoria da USP tratou todo o processo da EACH mostra o completo descaso que possuem com o campus situado na zona leste.
Camuflada de ‘preocupação real para que estudantes retornem às suas aulas na EACH” a reitoria tomou medidas puramente eleitoreiras. Se a comunidade da EACH está enfraquecida é muito em  função do cansaço após a interdição de seu campus e a diáspora que trabalhadores/ras, estudantes e  docentes fora submetidas/os, mas é fundamental que recuperem a força. Esta não foi uma luta perdida, e está longe de chegar ao fim. Portanto é preciso defender e construir uma unidade real entre estudantes do campus butantã e estudantes da EACH, mas também inserir o problema da EACH no cenário de descaso do governo estadual com os campus experimentais da UNESP que são sucateados e sofrem a mesma dor que a EACH. Quando estudantes da três estaduais paulistas conseguirem se integrar de fato e pensar políticas conjuntas, não haverá Reitoria capaz de barrar! Seguir em luta pela descontaminação da EACH e articular a unidade estudantil para os próximos desafios que surgirão.
A tradicional frase de luta “quando as de baixo se movem os de cima caem” precisa sempre vir acompanhada com a análise de que quanto mais avançamos e questionamos os privilégios dos de cima, maior torna-se o processo de repressão e perseguição contra todas as pessoas que ameaçam os “tronos da realeza”. Em momentos como estes as classes dominantes tentam nos desestruturar usando a tática do pânico como instrumento desmobilizador. É nesta hora que precisamos intensificar nossas respostas e mostrar para estes que nós estamos organizados e somos tantos que mesmo que prendam e ameacem nossas/os companheiras/os de luta seguiremos cada vez mais fortes.
Fábio Hideki é estudante e trabalhador da USP e está preso com base em um processo pautado em provas forjadas. Temos 12 estudantes respondendo processo judicial por terem travado a luta por permanência estudantil através da “Moradia Retomada”. São 72 pessoas também respondendo processo por lutar pela universidade pública e desmilitarizada. Brandão é diretor do SINTUSP e foi demitido por apoiar a organização dos/as trabalhaores/es, e mais uma dezena de processos, prisões e demissões ao longo de todo o páis e estado de SP. É mais do que necessário neste momento conseguirmos organizar uma luta unificada em defesa de todas e todos aquelas/es que estão sendo atacados pelos nossos inimigos de classe.
Para intensificar a luta é preciso pensar nos fóruns do movimento responsáveis por essa organização. Durante os momentos mais fortes da mobilização conseguimos instaurar o comando de greve, garantindo que a organização do movimento grevista ficasse pautado pela democracia direta. São nas assembleias de curso e entidades de base que as/os delegadas/os são eleitas/os e respondem diretamente às decisões tomadas pelas pessoas em suas assembleias. Durante o período de baixa mobilização e tendo em vista a dificuldade em organizar assembleias de bases, ficou suspenso o comando de greve através de delegação e instauramos o Comando de Mobilização, que seguiu realizando reuniões durante o mês de julho e era aberto a participação de qualquer pessoa com igual poder de voz e voto. O Comando de Mobilização teve papel fundamental para seguir mantendo as/os estudantes informadas/os da luta das/os trabalhadoras/es e para organizar e divulgar as iniciativas estudantis que não deixaram de aparecer apesar do esvaziamento que sofremos durante o mês de julho.
Esperamos que o Movimento Estudantil retorne agora em agosto com força total. A greve de trabalhadoras/es nos ensinou uma lição: se entramos em uma greve, que entremos pra valer. Construir uma greve significa assumir responsabilidades e tarefas, significam muitas horas de sono perdidas e trabalho intenso. Mas também nos lembra a todo momento que estamos em luta por uma causa justa e que somos muito mais fortes quando estamos concentrando forças nos mesmos objetivos ao invés de ficar fragmentando nossos esforços em cabos de guerra desnecessários. Deve ser contra os nossos inimigos de classe que nos levantamos e não contra nossos adversários ideológicos. O debate e a o tensionamento são importantes para avançarmos nos projetos da própria esquerda, mas temos um inimigo claro e ele está bem a nossa frente. Só a  mobilização massiva e radicalizada pode proporcionar o êxito de nosso movimento. Somente a unidade do movimento grevista pode responder ao  ataque da reitoria e do governo do estado de São Paulo.
Reinstauremos o comando de greve estudantil rumo à radicalização do movimento e aliança real com a greve de trabalhadoras/es.
Toda força à greve unificada das três categorias!
Avancemos!
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